A provida cabra, saindo de casa,
Em busca de pasto,
A encher o seu ubre que, à tarde, trazia
Pesado e de rasto;
Dizia ao cabrito, correndo a lingüeta:
"Se alguém cá vier,
Só deves abrir-lhe, se acaso esta senha,
Filhinho, te der:
— Má peste de cabo do lobo e lhe extinga
A pérfida raça!
Verás suceder-te, se não me atenderes,
Terrível desgraça".
Ouviu-lhe as palavras um lobo, que em frente
Da casa passou;
E logo no arquivo da pronta memória
Fiel as guardou.
Não vista da cabra, que logo se ausenta,
A fera voraz,
À porta dizendo metade da senha,
A voz contrafaz.
Suspeita o cabrito, e o luzio aplicado
Da porta na fenda:
"Só abro (responde) a quem alva pata
Por baixo me estenda".
Sabeis que tais patas nas rodas dos lobos
Estão em desuso.
Burlando o tratante, voltou como veio,
Corrido e confuso.
Ai! Pobre cabrito, se à senha atendesse,
Que o lobo lhe deu!
Dobrai de cautela; por mui precavido
Ninguém se perdeu.
Barão de Paranapiacaba (Trad.)