18/02/2010

Molly Whuppie



Era uma vez um homem e uma mulher que tinham filhos demais e não conseguiam comida para eles. Pegaram então os três menores e os abandonaram na mata. As crianças andaram, andaram, sem nunca avistar uma casa. Logo começou a escurecer, e ficaram com fome. Finalmente viram uma luz e caminharam rumo a ela; era uma casa. Bateram à porta e apareceu uma mulher, que perguntou:

“O que desejam?”

E elas responderam:

“Por favor, deixe-nos entrar e nos dê alguma coisa para comer:’ A mulher disse:
“Não posso, porque meu marido é um gigante, e se chegasse em casa comeria vocês.” Elas imploraram: “Deixe-nos descansar só um pouquinho”, disseram, “e iremos embora antes que ele chegue.” Ela as deixou entrar, instalou-as diante do fogo e deu-lhes leite e pão; mas as crianças mal tinham começado a comer quando se ouviu uma batida muito forte à porta, e uma voz pavorosa disse:

“Fi-feu-fo-fum, farejo o sangue de um mortal. Quem está aí com você, mulher?”
“Hum”, disse a mulher, “são três pobres meninas com frio e com fome, e já vão embora. Não toque nelas, homem:’

Ele não disse nada, mas devorou um lauto jantar e ordenou que elas passassem a noite toda ali. Ora, ele também tinha três meninas, e elas iam dormir na mesma cama que as três forasteiras.A mais nova das três meninas estranhas chamava-se Molly Whuppie e era muito esperta. Ela notou que, antes de irem para a cama, o gigante passou cordas de palha em volta do seu pescoço e do das irmãs, e correntes de ouro em volta do pescoço das próprias filhas. Assim, Molly ficou atenta e não dormiu, esperando até se certificar de que todos estavam mergulhados num sono pesado. Depois se esgueirou da cama, soltou as cordas de palha do seu pescoço e do das irmãs e tirou as correntes de ouro do das filhas do gigante. Pôs então as cordas de palha nas meninas do gigante e as de ouro em si mesma e nas irmãs e se deitou.

No meio da noite o gigante se levantou, armado de um enorme porrete, e procurou os pescoços com a palha. Estava escuro. Ele tirou as filhas da cama e, no chão, surrou-as até matá-las, depois foi de novo se deitar, pensando que tinha se dado bem. Molly, achando que era hora de cair fora dali com as irmãs, acordou-as, disse-lhes que ficassem bem quietinhas, e todas fugiram sorrateiramente da casa.

Saíram sãs e salvas e correram, correram, sem nunca parar até de manhã, quando viram uma magnífica casa diante de si. Era a casa de um rei; Molly entrou e contou sua história ao rei. Ele disse: “Bem, Molly, você é uma menina esperta e realizou uma proeza; mas se quisesse realizar uma proeza maior ainda, e voltar para furtar a espada do gigante, que fica pendurada atrás da cama dele, eu daria meu filho mais velho em casamento à sua irmã mais velha.” Molly disse que tentaria. Assim ela voltou, conseguiu penetrar na casa do gigante e se meteu debaixo da cama. O gigante chegou em casa, comeu um lauto jantar e foi se deitar. Molly esperou que ele começasse a roncar e avançou furtivamente, esticou o braço por cima dele e pegou a espada; mas no instante em a passava sobre a cama, ela tilintou.

O gigante deu um pulo e Molly saiu porta afora, levando a espada. Correu, correu, até que chegou à Ponte de um Cabelo. Molly conseguiu passar, mas o gigante não, e disse:”Maldita seja, MollyWhuppie! Nunca mais volte aqui.” E ela respondeu: “Duas até agora, grandalhão, vou-me embora para a Espanha:’ Assim, Molly levou a espada para o rei e sua irmã se casou com o filho dele.

“Bem”, o rei disse, “você realizou uma proeza; mas se realizasse uma ainda maior e furtasse a bolsa que fica debaixo do travesseiro do gigante eu casaria sua segunda irmã com meu segundo filho.” E Molly disse que tentaria.

Assim, partiu para a casa do gigante, entrou nela de mansinho, escondeu-se de novo debaixo da cama, e esperou o gigante terminar seu jantar e roncar num sono profundo. Saiu do seu esconderijo, enfiou a mão debaixo do travesseiro e puxou a bolsa. Mas no instante em que estava saindo o gigante acordou e correu atrás dela. E ela correu, e ele correu, até que chegaram à Ponte de uni Cabelo, e ela passou, mas ele não conseguiu, e disse: “Maldita seja, Molly Whuppie! Nunca mais volte aqui.”
“Mais uma vez, grandalhão”, ela exclamou, “vou-me embora para a Espanha:’

Assim Molly levou a bolsa para o rei, e sua segunda irmã se casou com o segundo filho do rei. O rei disse então a Molly: “Molly, você é uma menina esperta, mas se fizesse melhor ainda e furtasse o anel que o gigante usa no dedo eu lhe daria meu filho mais moço em casamento.” Molly disse que tentaria.

Assim, lá foi ela de novo para a casa do gigante, e se escondeu debaixo da cama. O gigante não demorou muito a chegar e, depois de dar cabo de um lautíssimo jantar, foi para a cama e logo estava roncando alto. Molly se esgueirou, esticou o braço por cima da cama, segurou a mão do gigante e puxou, puxou até conseguir arrancar o anel. Mas no instante em que o pegou, o gigante acordou, agarrou-a pela mão e disse: “Desta vez peguei você, MollyWhuppie, e, se eu lhe fizesse tanto mal quanto me fez, o que faria comigo?”

Molly disse: “Enfiaria você num saco e meteria junto lá dentro o gato, e mais o cachorro, e uma agulha e linha e tesoura, e penduraria você na parede, e iria até a mata, e escolheria a vara mais grossa que pudesse encontrar, e voltaria para casa, despenduraria você e surraria até que morresse.” “Bem, Molly,” disse o gigante, “é isso mesmo que vou fazer com você:’ Apanhou um saco e enfiou Molly dentro, e junto com ela o gato e o cachorro, e uma agulha e linha e tesoura. Pendurou o saco na parede e foi para amata escolher uma vara. Quanto a Molly, ela cantou: “Ah, se visse o que estou vendo!”
“Oh!”, perguntou a mulher do gigante. “O que está vendo, Molly?”
Mas Molly não dizia uma palavra a não ser: “Ah, se visse o que estou vendo!”
A mulher do gigante implorou a Molly que a deixasse entrar no saco para ver o que ela estava vendo. Assim, Molly pegou a tesoura e cortou um buraco no saco e, levando consigo a agulha e a linha, pulou fora, ajudou a mulher do gigante a se enfiar lá dentro e costurou o buraco. A mulher do gigante não viu patavina, e começou a pedir para sair de novo. Mas Molly não fez o menor caso e tratou de se esconder atrás da porta.

Eis que chegou o gigante, uma árvore enorme na mão, e desceu o saco e começou a surrá-lo. Sua mulher gritava “Sou eu, homem”, mas o cachorro latia e o gato miava e ele não reconheceu a voz da esposa. Então Molly saiu de detrás da porta e o gigante a viu e saiu atrás dela; e ele correu, e ela correu, até que chegaram à Ponte de um Cabelo, e ela passou mas ele não pôde. E ele disse: “Maldita seja, MoilyWhuppie! Nunca mais volte aqui.

“Nunca mais, grandalhão”, ela exclamou. “Vou-me embora de novo para a Espanha:’
Assim Molly levou o anel para o rei e se casou com o seu filho caçula e nunca mais viu o gigante de novo.


Joseph Jacobs
(versão brasileira)