25/10/2010

O cavaleiro desmantelado

Era uma vez, dois pequenos reinos separados por uma floresta e uma feroz inimizade.
Um ao norte e outro ao sul do Grande Bosque Sombrio, brigavam pelas riquezas que imaginavam ali existirem, como: ouro, prata e pedras preciosas.
Há cinco gerações se detestavam, desde quando o segundo rei de Cropas, do reino do norte, declarara para quem quisesse ouvir que a floresta e suas maravilhas lhe pertenciam por direito de sua vontade.
O soberano do sul, rei de Praus, dissera aos seus súbditos que, também por vontade , eram seus aqueles tesouros e, por causa de opiniões tão diferentes, em quase duzentos anos, não houve sossego nas duas terras.
Um dia, não se sabe como, espalhou-se nos reinos a notícia alarmante de que a guerra era eminente. O rei de Praus alisou seus bigodes retorcidos e mandou que suas tropas se preparassem. O rei de Cropas acariciou sua barbicha e deu uma ordem igual. Assim, ficou tudo pronto para a mudança. Entretanto, para sorte dos soldados que iriam tombar na luta , havia no reino de Cropas um sábio que teve uma visão e contou-a ao rei.
- Vi apenas dois homens se enfrentando no campo de batalha: um lutando por Cropas e o outro por Praus.
O rei de Cropas, louro de barbicha pensou e pensou nas palavras do sábio. Teve uma ideia: seu primo Rodolfo Coração de Bode, era um valente cavaleiro e, provavelmente, não havia em Praus alguém que se lhe comparasse. Era melhor arriscar o parente do que seus minguados batalhões. Mandou, então, três embaixadores ao outro lado proporem um duelo e deixarem escapar nas negociações que Rodolfo Coração de Bode tinha o peito e os braços fracos, estando já mais para lá do que para cá.
O rei de Praus ouviu a proposta com agrado, pois o exército do reino andava mal das pernas e de armas. Combater um cavaleiro moribundo era muito conveniente. Aceitou na hora. O confronto seria daqui a sete dias.
O rei de Cropas tinha Rodolfo, mas quem lutaria por Praus?
De pura sorte, ou talvez, por artes das fadas ou bruxas, apareceu no castelo de Praus, seis manhãs após a visita dos embaixadores, um cavaleiro andante embrulhado numa antiga armadura, completamente escondido dentro da lataria mal conservada. Vinha num cavalo de passo cansado. Desmontou com dificuldade e se apresentou:
- Sou o cavaleiro Desmantelado e peço pousada.
O rei de Praus não titubeou e deu a pousada, mas foi consultar o seu sábio.
- O que quer dizer Desmantelado?
O sábio examinou seus livros e disse:
- Quer dizer desconjuntado.
- Ah! Fez o rei. Ele me pareceu uma estranha figura. Um tanto amassado, mas nos servirá, já que o adversário não é bom de braços. Vou convidá-lo para a disputa , agora mesmo.
O rei encontrou o desconhecido tentando tirar seu elmo emperrado. Aceitou na hora o pedido do rei, mas fez um pedido também.
- Queria um pouco de cola e corda para remendar a sua armadura..
Naquela noite,os reinos de Praus e Cropas dormiram agitados pensando na disputa do dia seguinte.
Bem cedo , os reis buscaram bons lugares para apreciar a disputa. Na hora combinada, um clarim indicou que os dois competidores tomassem as posições.
Surgiu Rodolfo com um penacho vermelho, cor de Cropas, altivo e aprumado. O cavaleiro Desmantelado apareceu com sua armadura rangendo de tanta ferrugem e seu elmo emperrado.
Começa a luta e desmantelado balança perigosamente. Os dois se enfrentam e para surpresa geral, caem os dois. Esparramam-se no chão. Não conseguem levantar-se. De repente, Desmantelado grita implorando por água. Dêem-me água pois há dezoito horas não como nem bebo por causa do elmo emperrado.Rodolfo conhece a voz fanhosa do rapaz e descobre que é Privaldo, um jovem de Praus , que partira há muitos anos para correr mundo, era seu melhor amigo. Foram eles os únicos habitantes dos dois reinos que se encontraram durante os duzentos anos de ódios. Ele vai até o amigo destranca-lhe o elmo com um pedaço de sua lança e manda seu escudeiro dar água ao amigo. Desmantelado reconhece Rodolfo e se emociona. Eles tiram as armaduras e se abraçam e a multidão fica boquiaberta, porque eles revelam a verdade do Bosque Sombrio: nada de ouro, de prata , de pedras preciosas... apenas um pomar de maçãs.
Chamam o povo para colher maçãs e todos os seguem felizes.
Os reis percebem que não adiantava mais guerrear já que a única coisa que restava era também comerem maçãs.
Assim, acabou a briga entre os dois reinos e viveram felizes ...com sua maçãs!!!