Uma vez uma besta do Tesouro,
Uma besta fiscal,
Ia de volta para a capital
Carregada de cobre, prata e ouro,
E no caminho
Encontra-se com outra carregada
De cevada
Que ia para o moinho.
Passa-lhe logo adiante
Largo espaço,
Coleando arrogante
E a cada passo
Repicando a choquilha,
Que se ouvia distante.
Mas salta uma quadrilha
De ladrões,
Como leões,
E qual mais presto
Se lhe agarra ao cabresto.
Ela reguinga e dá uma sacada,
Já cuidando
Que dispersava o bando;
Mas, coitada!
Foi tanta a bordoada,
Que exclamava enfim
A besta oficial:
«Nunca imaginei tal!
Tratada assim...
Uma besta real!
Mas aquela, que vinha atrás de mim,
Porque a não tratais mal ?!
– Minha amiga, cá vou no meu sossego:
Tu tens um belo emprego;
Tu sustentas-te a fava, e eu a troços;
Tu lá serves El-Rei, e eu um moleiro;
Eu acarreto grão, e tu dinheiro:
Ossos do ofício... que não há sem ossos!»
Tradução de João de Deus