Convida, uma vez, ratinho
Mui galante e cortesão,
Certo arganaz montesinho
A sobras dum perdigão.
Em guedelhudo tapete
Luz o esplêndido talher.
São dois, mas valem por sete.
Que apetite! que roer!
Foi folgança regalada;
Nada inveja um tal festim.
Senão quando, na malhada,
Pilha-os súbito motim.
Passos à porta da sala...
Param os nossos heróis.
E o terror, que pronto os cala,
Lança em pronta fuga os dois.
Foi-se a bulha. Muito à mansa
Vêm-se chegando outra vez.
«Dêmos remate à folgança –
Diz o da corte ao montês.
– Nada. Mas vem tu comigo
Jantar amanhã; bem sei
Que lá me não gabo, amigo,
Desta vidinha de rei.
Mas ninguém me turba em meio
Do jantar; sobra o lazer.
E adeus. Figas ao prazer
Que pode aguar um recreio.»
Tradução de José de Sousa Monteiro