28/12/2010

Queda para o negócio



Um rato, que andava a viajar, chegou, a certa altura, à margem de um rio profundo. Nem ponte nem barco.
Uma rã, que andava por ali, ofereceu-se para levá-lo até ao outro lado. Como paga pelo serviço pedia vinte mosquitos.
- Mosquitos não tenho, que não é moeda do meu uso - disse-lhe o rato. - Mas se aceita o câmbio, disponho de notas de mais valor, na minha bagagem. Quer receber duas fatias de queijo pelo trabalho?
- Três - respondeu a rã, que tinha queda para o negócio.
O rato acedeu. Também não lhe restava outra alternativa...
A rã pôs-se a nadar, com o rato encavalitado no dorso.
Faltavam talvez dois terços da viagem, quando a rã disse:
- Afinal você pesa mais do que eu supunha. Levo quatro fatias pelo transporte.
O rato, que não sabia nadar, olhou para a água, em corrente assustadora, e disse que sim. Nem tinha outro remédio.
Mais adiante, voltou a rã:
- Estive a pensar que quatro fatias não chegam. Ficamos em cinco. O que é que acha?
O rato atemorizado achou bem. Se achasse mal, o que o esperaria?
Estavam a chegar ao sítio mais fundo do rio.
- Amigo rato, vamos concluir o negócio. Eu por doze fatias levo-o à outra margem. Combinado?
- Combinado... - disse o rato, a tremer de medo.
E assim continuaram, até terem a margem à vista. Mais calmo, o rato falou assim:
- Eu não sou de regatear, mas sobre aquela nossa conversa de há bocado, compete-me dizer que acho o seu preço muito pesado.
- Mau! - sobressaltou-se a rã. - Então em que ficamos?
Estava a margem à largura de um salto. Foi o salto que o rato deu, salpicando-se todo. Mas estava em terra firme.
- Então, afinal, em que ficamos? - perguntou a rã, a boiar de bruços.
- Eu fico aqui, agora você vá para onde lhe apetecer, que não quero ser eu a mandá-la - respondeu o rato.
E desapareceu, pelo meio de uns caniços.
- Já me tinha constado que se não deve concluir negócios com ratos - disse de si para si a rã. - São muito pouco honestos...
E o que diria o rato, se pudéssemos ouvi-lo?

António Torrado