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11/05/2011

Sansão



Sansão era irmão de Salomão. Era de muita força e tiraram-lhe os olhos. Dês que se viu cego, quis morrer, mas não sozinho. Pediu a um rapazinho que o levasse à igreja, aonde estavam à missa, e disse ao rapazinho que o arrumasse a uma coluna da igreja e o rapazinho que se fosse embora. O rapaz assim fez. Depois Sansão fez força e deitou a coluna abaixo e com ela a igreja e disse:
— Morra Sansão e quantos aqui estão!
E assim aconteceu.


Recolha de Leite de Vasconcelos

09/05/2011

A Pereira Mágica



Um camponês vendia no mercado pêras doces e perfumadas, mas muito caras. Diante da carroça de pêras, um monge taoísta pedia esmolas. Ele tinha a túnica esfarrapada e o capuz rasgado.
-Quer fazer a gentileza de dar o fora daqui! - gritou o camponês.
O monge recusou-se a ir embora. Com muita raiva, o camponês começou a insultá-lo. Depois de um tempo, o monge disse:
-Você tem uma quantidade enorme de pêras, e eu, um velho monge maltrapilho, quero uma só. Por que ficar com tanta raiva, se vai perder muito pouco se me der o que estou pedindo?
As pessoas em volta sugeriram que o vendedor de pêras se livrasse do monge dando-lhe uma, não das mais bonitas, claro, para que ele deixasse o lugar, mas o camponês se recusou a aceitar essa idéia.
No fim, um rapazinho de uma birosca ali perto, atordoado com a gritaria, tirou do bolso uns tostões e comprou come uma pêra, oferecendo-a ao monge, que prontamente agradeceu gesto tão caridoso. Em seguida, o monge virou-se para a multidão e disse:
-Nós, religiosos, que deixamos nossas famílias, não conseguimos compreender por que existe tanta avareza. Eu, por exemplo, tenho pêras excelentes, e gostaria muito de reparti-las com vocês.
- Mas, se tem pêras excelentes, por que não come uma delas, em vez de ficar aqui nos aborrecendo? – perguntou um dos homens.
-Porque eu preciso das sementes para plantar – respondeu o monge.
Imediatamente, ele pegou a pêra com as duas mãos e começou a comê-la. Pelo jeito, devia estar bem gostosa. Antes de terminar, pôs as sementes na palma da mão, tirou a pequena pá que carregava na cintura, usada para colher plantas medicinais e começou a cavar um buraco. Quando o buraco ficou pronto, jogou dentro deles as sementes, cobrindo-as com terra.
O monge ficou de pé, examinou com cuidado a cova que tinha feito e disse que precisava regá-la com água quente. Um curioso trouxe um pouco, de uma venda ali perto, e o monge despejou-a devagar sobre a terra recém revolvida.
Todo mundo seguiu seus movimentos com atenção. E nesse instante, saiu da terra um broto, que cresceu, e instantes depois se transformou numa árvore com galhos frondosos. Nem bem as pessoas se recuperaram da surpresa, as flores desabrocharam nos galhos, que se inclinaram, carregados de pêras doces e perfumadas.
O monge taoísta subiu na pereira e começou a colher as pêras dos galhos mais altos, oferecendo-as a quem quisesse. Num piscar de olhos, tudo foi distribuído. O monge pegou então a pá e bateu com ela no tronco da pereira, quebrando-o em pouco tempo. Pôs o tronco nos ombros, com a folhagem, e seguiu tranquilamente pela rua.
O camponês, que tinha entrado no meio da multidão logo no início, quando o monge tinha começado a plantar as sementes, estava tão fascinado que nem se lembrava mais da carroça. E quando o monge afastou-se, voltou correndo para as suas pêras e teve uma surpresa maior ainda: a carroça estava vazia.
Por fim ele compreendeu o que tinha acontecido. Eram suas as pêras que o monge havia distribuído de maneira tão generosa. Ele percebeu também que a carroça estava sem um dos varais, certamente serrado há bem pouco tempo. Indignado, foi atrás do monge. No canto do muro, estava o varapau que faltava. Era ele, então, o tronco da árvore! Quanto ao taoísta, nunca soube em que direcção tinha seguido.

por Pu Songling (1640-1715)


08/05/2011

Gigante procura casa



Era uma vez um gigante que andava à procura de casa. Tarefa difícil.
Os gigantes, antigamente, moravam em castelos e, segundo contam histórias desses tempos, a sombra que a sua imensa altura projectava sobre os povoados aterrorizava as gentes. Dantes.
Este não era má pessoa. À primeira vista não parecia, quem o olhasse de baixo. Mas, passada a primeira impressão, percebia-se que era um bom gigante.
Também tivera um castelo à sua medida. Dificuldades várias tinham levado o castelo à ruína. Chovia lá dentro, mesmo quando não chovia cá fora. Problemas de canalizações ou do que fosse, o facto é que a morada dos antepassados do bom gigante foi vendida por tuta-e-meia e, depois de grandes obras de restauro, transformada numa estalagem de juventude.
Mas, como o bom gigante já não era novo, teve de ficar à porta.
Dormir ao relento é muito desconfortável, qualquer que seja o tamanho de quem se veja obrigado a tal experiência. Por isso o gigante pôs-se a procurar casa.
Como se começou por dizer, a tarefa era difícil. Hoje, ninguém constrói casas para gigantes. Três assoalhadas, quatro assoalhadas ou pequenas moradias com um quintalinho, ainda se arranja. Mas um gigante precisa de mais espaço.
- Nem que andasse sempre de gatas conseguia viver em casas assim - lamentava-se o gigante.
Chegou a morar, um mês, numa casa, só por causa do corredor, que era muito comprido. Para dormir, estendia-se no corredor, mas não podia dobrar as pernas. Uma grande contrariedade para quem, como era o caso dele e é o meu, gosta de dormir de lado, com as pernas encolhidas.
Alugou depois uma vivenda, que tinha garagem. Dormia na garagem e dispensava a casa. Mas como a porta automática da garagem se abria, por qualquer movimento mais sacudido que fizesse durante o sono, apanhou um resfriamento e, muito constipado e desiludido, teve de desistir desta solução.
Mas porque é que ele não mandava construir uma casa à sua altura, como quem faz um fato no alfaiate, por medida? Isto qualquer um pode perguntar. Ele que responda.
- Não tenho dinheiro que chegue - explicava, muito pesaroso. - Uma casa para um gigante não é uma casa qualquer. Exige muito tijolo, muito cimento, muito azulejo. Se eu não fosse tão comprido...
Um médico, que ele consultou, disse-lhe, meio a sério, meio a brincar:
- Isso resolve-se. Corta-se um bocado. O difícil é a escolha. Ou as pernas ou a cabeça.
O gigante saiu do consultório, a correr. Nem pagou. Bem feito para o médico não se fazer de engraçado.
Ao fim de muitas voltas, alugou um armazém abandonado, à beira de um cais. Não tinha muitas comodidades, mas era avantajado como lhe convinha. A renda também era avantajada, o que já não lhe convinha tanto.
Para poder pagar o aluguer do armazém, teve de procurar trabalho. Vá que vá que conseguiu arranjar emprego, sem grandes demoras. E perto de casa.
O bom gigante trabalha, agora, nos carregamentos e descarregamentos dos barcos acostados ao cais. Faz as vezes de guindaste e dá muito boa conta do serviço. Um bocado cansativo, mas ele não se queixa.
A vida, hoje em dia, não está fácil para ninguém. Nem para os gigantes.

05/05/2011

A Formiga e a Pomba



Uma formiga foi à margem do rio para beber água, e, sendo arrastada pela forte correnteza, estava prestes a se afogar.
Uma pomba que estava numa árvore sobre a água, arrancou uma folha, e a deixou cair na correnteza perto dela. A formiga, subiu na folha, e flutuou em segurança até a margem.
Pouco tempo depois, um caçador de pássaros, veio por baixo da árvore, e se preparava para colocar varas com visgo perto da pomba que repousava nos galhos alheia ao perigo.
A formiga, percebendo sua intenção, deu-lhe uma ferroada no pé. Ele repentinamente deixou cair sua armadilha, e isso deu chance para que a pomba voasse para longe a salvo.

Moral da Estória:
O grato de coração sempre encontrará oportunidades para mostrar sua gratidão.


Fábulas de Esopo
(Século VI a.c.)