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05/03/2011

O corvo ganancioso



Era uma vez uma boa pomba que vivia em um ninho próximo a uma cozinha. Os cozinheiros dali gostavam dela, e costumavam alimentá-la com grãos. Ela gostava do local, e tinha uma boa vida. Certo dia um corvo viu a pomba, e viu a maravilhosa comida que ela conseguia da cozinha. Assim, ele fez logo amizade com a pomba, e, sob esse pretexto, passou a compartilhar o ninho com ela. A pomba disse-lhe, então, que eles podiam passar o tempo discutindo política, religião ou outros assuntos afins, mas, em se tratando de comida, cada qual deveria cuidar de si mesmo. O corvo, então, impacientou-se, pois a comida era o único motivo pelo qual estava ali. Ele queria carne, mas tudo que a pomba conseguia da cozinha eram grãos.
Ele não mais podia esperar, e decidiu ir até a própria cozinha em busca de seu alimento. Assim, ele cautelosamente desceu pela chaminé da cozinha, onde sentiu um maravilhoso cheiro de peixe fritando na panela. O corvo não pôde resistir, e avançou pela cozinha em busca do peixe frito. Mas, no caminho, ele derrubou uma jarra, fazendo um grande barulho. A agitação alertou um cozinheiro que estava no aposento ao lado da cozinha, e ele logo capturou e matou o corvo.

Moral: A Ganância entorpece a Inteligência.


Histórias Hindus

04/03/2011

O cego e o sol



Era uma vez um cego de nascença. Nunca tinha visto o sol e perguntava como ele era para as pessoas. Alguém lhe disse: “é como uma bandeja de latão”, e quando o cego, um dia, deu com uma bandeja pendurada, ouviu o som de metal e guardou-lhe como recordação do sol. Um dia, porém, tocaram sinos de bronze e o cego pensou que era o sol. Até que alguém lhe disse: “a luz do sol, na verdade, é como uma vela”. Um dia, o cego apalpou a vela e pensou que esta era a forma do sol. Assim, um dia encontrou um pedaço de bambu no chão e pensou tratar-se do sol. O Sol é muito diferente do sino ou do bambu, mas o cego não pode ver isso porque nunca viu o sol. O Tao é mais difícil de ver do eu o sol, e por isso os homens são com o cego. Ainda que vocês façam comparações, exemplos e tratados, o Tao será como o sol para o cego, parecido com uma bandeja, com um sino ou um bambu. Sempre imaginaremos uma coisa, esquecendo de outra. Assim, os homens se afastam cada vez mais da verdade, dando lhe aparências através de nomes. Todos estes enganos são tentativas de compreender o Tao.

(De Su Tungp’o)

03/03/2011

O asno e o cãozinho

Um homem que tinha um cão de Malta e um asno passava o tempo brincando com o primeiro. Quando ia jantar fora, trazia um pedaço de carne e o dava ao animal, que vinha balançando o rabo.
Um dia, tocado pela inveja, o asno foi ao encontro do dono e, querendo pular igual ao cão, terminou dando-lhe um coice. Furioso, o dono deu-lhe uma surra e ordenou que o amarrassem a um poste.

Moral: A cada qual a sua maneira de ser.


Fábulas de Esopo

02/03/2011

A Tartaruga e os Patos


Era uma vez uma Tartaruga que queria conhecer o mundo. Confiou este seu desejo a dois Patos que viviam perto dela, numa lagoa.
Um belo dia, a lagoa secou e os Patos prepararam-se para partir. Antes, porém, foram despedir-se da sua amiga e fizeram-lhe um convite:
- Se quiseres, podes vir conhecer o mundo connosco. Cada um de nós segura a ponta de um ramo e tu agarras-te bem a ele com a boca. Assim, ficarás em segurança e poderás ver, lá do alto, cidades e reinos maravilhosos.
A Tartaruga nem pensou duas vezes: aceitou o convite e, nesse mesmo dia, partiram todos à aventura. Sobrevoaram aldeias, cidades e reinos de encantar. Quando passavam por cima de um campo, os camponeses admiraram-se com o que viram e gritaram:
- Vejam! Vejam! Uma Tartaruga a voar!
- Como sou extraordinária! - gritou a Tartaruga cheia de orgulho.
Porém, assim abriu a boca, largou o ramo e estatelou-se no chão.

Moral da história:
Aceita o triunfo com modéstia.


Fábulas de La Fontaine

01/03/2011

A Cerva na gruta do Leão



Uma cerva que fugia de uns caçadores, chegou a uma gruta onde não sabia que morava o leão. Entrando nela para se esconder, caiu nas garras do leão. Vendo-se sem remédio, perdida, exclamou:
- Infeliz de mim! Fugindo dos homens, caí nas garras de um feroz animal.

Moral da Estória:
Se tratas de sair de um problema, busca uma saída que não seja cair em outro.


Fábulas de Esopo
(Século VI a.c.)

O asno e o seu amo



Um asno que conduzia seu amo trotava por um caminho fácil, mas depois seguiu por um caminho difícil, muito escarpado. Como ia caindo no fundo de um precipício, o homem agarrou-o pela cauda e fez tudo para o asno desistir da viagem. Mas o asno resistiu com todas as suas forças, de modo que o homem o largou dizendo: "Está bem, venceste, mas ao mesmo tempo encontraste tua derrota".


Fábulas de Esopo

28/02/2011

Os dois pombos



Amavam-se dois pombos ternamente
Com suave meiguice e amor profundo.
Um deles – que loucura! – de repente
À casa toma tédio, quer ver mundo.

«Que vais fazer? – diz-lhe então
Já saudoso o companheiro.
Medita, pensa primeiro,
Assim deixas teu irmão?
Ninguém duvida que a ausência
É dos males o maior;
Não para ti!... Só se for
Que os trabalhos, a inclemência,
E dessa jornada o p’rigo,
Que pretendes arrostar,
Possam teu peito mudar
Em peito bondoso, amigo.
Se mais perto a Primavera
Sorrisse alegre, então... vá!
Quem te obriga a partir já?
Espera o zéfiro, espera.
Há pouco um sinistro corvo
Crocitou, e à nossa raça
Agoirou muita desgraça
Em tom profético e torvo.
Só nas coisas infelizes
Doravante pensarei;
Em redes, falcões, que sei?...
Tiros, flechas e boízes.
Ah! – direi quando chover:
Meu pobre irmão, coitadinho,
Terá ceia, terá ninho,
E tudo o que lhe é mister?»

Esta linguagem branda e cheia de bondade
Enternecê-lo faz;
Teve porém mais força a indómita vontade
Do viajante audaz.

«Não chores; três dias bastam-me
– Já vês que é curta a demora –
Para matar este férvido
Desejo que me devora.
Quando voltar, com que júbilo
Referirei por miúdo
Aventuras, episódios,
Incidentes, tudo, tudo!
Quem pouco vê, é certíssimo,
Que pouco pode contar.
Eu te direi que em tal época
Achava-me em tal lugar,
E tu, enlevado, extático,
De me ouvir falar assim,
Hás-de julgar – asseguro-te –
Que estavas ao pé de mim.»

Assim falou, e em pranto de soluços
Despediram-se os dois. O viajante
A jornada começa. Não distante
Da casa, que fugira, carregada
Ergue-se no ocidente escura nuvem
Que em chuva se desata, e o peregrino
Corta os ares em louco desatino,
Um albergue buscando, uma pousada.
Negro tronco, de folhas quase nu,
Se lhe depara então. Voa ligeiro,
E mal pôde encontrar de triste ulmeiro
Entre a folhagem rara asilo pobre.
Depois, quando outra vez se anila o céu,
Frio, molhado sai do humilde abrigo,
Enxuga as penas, parte, e muito trigo
Espalhado no campo além descobre.

Outro pombo vê perto, e sem detença
Dirige-se p’ra lá.
E quando cuida mais, quando mais pensa
Gozar com seu igual ventura imensa,
Num laço preso está,
Que por mão ardilosa, enganadora,
Por debaixo do trigo armado fora.

O laço era já velho. O prisioneiro
Esforça-se, porfia, teima, luta;
De tal forma trabalha
Co’as asas, bico e pés, que enfim consegue
Quebrá-lo, ver-se livre, muitas penas
Deixando na batalha.

Mas a fortuna má, que o segue, e nutre
Contra o pombo infeliz ódio entranhado,
Já lhe mostra nos ares um abutre,
Que voraz, esfaimado,
Mal o avista, a vontade sente acesa
De lhe deitar a garra e fazer presa.
E o mísero, que traz restos de guita
A cortar-lhe inda os pés,
Um galeote, um criminoso imita
Fugido das galés.

Eis que porém naquele mesmo instante,
Batendo as asas longas,
Das nuvens arremessa-se gigante
Uma águia, e sem delongas
Trava-se entre os ladrões rude peleja
Por lograr cada qual o que deseja.

O pombo, como terceiro,
Aproveita do combate;
Ergue o voo, e só o abate
Quando encontra um pardieiro,
De seu bárbaro destino
Julgando o pobre animal
Que a peripécia final
Era este caso mofino.
Mas um rapaz turbulento
– Não tem compaixão a infância –
Uma pedra com tal ânsia
Lhe envia, que sem alento
Quase o deixa. Maldizendo
A sua curiosidade,
Vai para casa gemendo,
Meio coxo, meio morto,
E sem outra novidade
Chega do ninho ao conforto.


Tradução de José António de Freitas

Mais um



Era uma vez uma galinha pedrês que só sabia contar até três.
Logo aconteceu nascerem-lhe quatro pintainhos.
Ela contava-os assim:
- Um... dois...três... e mais um.
- Três mais um, quatro - dizia-lhe o pato.
Mas ela não havia meio de aprender. Sempre vigilante à beira dos filhos, a pedrês ralhava:
- Não impliques com teus irmãos, Mais Um! Não queiras a comida toda para ti, Mais Um!
Ficou a chamar-se Mais Um. Frango e depois galo, como era bruto e pespontão, ganhou o nome de Mais Um, ?O Terrível".
As galinhas que o dissessem, coitadas, de crista sempre a sangrar das bicadas do tiranete. Todo o povo da capoeira o detestava. E com razão.
Mais Um, ?O Terrível", cantava de alto. Estou mesmo convencido que se não fosse ele o primeiro a alarmar os campos adormecidos com os seus gargarejos de madrugador, os restantes galos do povoado, por acanhamento, nem cantariam.
Foi o que aconteceu, ainda há pouco. Ontem, à espera da voz de comando do Mais Um, não houve galo que cantasse a alvorada. Que acontecera?
Os pombos do pombal é que espalharam a notícia:
- Morreu Mais Um às mãos da Conceição do facalhão.
- Mais Um sacrificado, em canja e em guisado...
- Lá está Mais Um no prato, duro que nem sola de sapato...
Houve um certo alívio nos galinheiros. Mas, agora me lembro que hoje os galos ainda não cantaram. Porquê? Talvez um secreto mal-estar se tenha espalhado pela criação. Imagino os galos no poleiro, cada um por si, a matutar: ?Foi-se Mais Um... Quem irá, depois?" Pensamentos destes não dão mote para cantigas.

António Torrado

O leão, Prometeu e o elefante




Frequentemente, o leão se queixava a Prometeu:
- Me fizeste grande e belo; me deste dentes afiados e garras; fizeste de mim o mais forte de todos os animais. E, apesar disso, tenho medo do galo.
Prometeu respondia:
- O que significam essas tolas reclamações? Tens tudo o que eu, com meu poder, podia te dar. Salvo o galo, nada abala a tua coragem.
Mas o leão chorava o seu destino e se acusava de fraco. Terminou desejando morrer. Estava assim perdido em seus pensamentos quando encontrou o elefante. Saudou-o e, tendo parado para falar com ele, observou o movimento que lhe agitava as orelhas sem parar.
- O que tens? –perguntou. –Tuas orelhas não podem ficar um instante paradas?
E, como um mosquito não parava de voar à sua volta, o elefante respondeu:
- Estás vendo esse ser minúsculo que zumbe? Se entrar um em minha orelha, estou morto.
O leão disse então:
- Por que morrer, se, para minha felicidade, minha força está para o elefante assim como o galo está para o mosquito! O mosquito é bastante forte para abalar o elefante.


Fábulas de Esopo

27/02/2011

Judar, o pescador, e o saco encantado



Conta-se, ó afortunado rei, que vivia certa vez um mercador chamado Omar. Tinha ele três filhos: Salim I, Salim II e Judar, o mais jovem. Havia-os criado até a maturidade; porém sem-pre preferiu Judar, o que levava seus dois irmãos invejá-lo e odiá-lo. Quando Omar, que era muito velho, notou esse ódio, receou que Judar fosse molestado por seus irmãos após a sua morte e, na presença do cádi, partilhou seus bens em quatro partes iguais: uma para cada filho e uma para a mulher. Após a morte do pai, os três irmãos arruinaram-se em processos que Salim e Salim moveram contra Judar. Depois, Salim e Salim maltrataram, burlaram e roubaram a mãe. E ela se refugiou junto a Judar, o qual, embora empobrecido, a acolheu com todo carinho. Os dois Salim caíram rapidamente na miséria, pois não conheciam pro-fissão alguma e eram preguiçosos e malvistos. Procuraram a mãe, chorando. Uma mãe é sempre compassiva.
Passou a servir-lhes as sobras da casa de Judar, dizendo-lhes, todavia: "Comei rapidamente e saí. Se vosso irmão vos surpreender aqui, poderá virar-se contra mim." Um dia, contudo, enquanto comiam, Judar chegou. Mas em vez de zangar-se, sorriu para seus irmãos, abra-çou-os e convidou-os a morar com ele. Sua mãe gritou: "Meu filho, possa Alá abençoar-te e aumentar tua prosperidade: és o mais generoso de todos nós." Judar ia cada manhã lançar sua rede ao mar, e viviam, ele, a mãe e os irmãos, do produto de sua pesca. Certa vez, jogou a rede três dias seguidos sem nada apanhar. No quarto dia, foi a uma praia mais distante no lago Karun e enquanto se preparava para lançar a rede às águas, viu um mouro deslocan-do-se em sua direção, montado numa mula. O mouro apeou, cumprimentou Judar e dis-se-lhe: "Ó Judar, filho de Omar, preciso de teus préstimos. Se me obedeceres, recolherás grandes vantagens. Serás meu amigo e o encarregado de meus negócios." O jovem prome-teu obedecer. Disse o mouro: "Recita a Fatiha para dar à tua promessa um caráter sagrado." Judar recitou a Fatiha. Disse então o mouro: "Amarra meus braços atrás das minhas costas com estas cordas, joga-me no mar e espera. Se as minhas mãos saírem da água em primeiro lugar, lança tua rede e traze-me às costas. Pois não sei nadar. Mas se forem meus pés que emergirem primeiro, considera-me morto. Leva então esta mula e este saco ao mercado e procura por Chamaia, o judeu. Pagar-te-á cem dinares pela mula. Teu único dever será guardar o segredo." Judar seguiu as instruções do mouro, e ao ver os pés emergirem primeiro, montou a mula e foi ao mercado onde localizou o judeu. O judeu pagou-lhe os cem dinares prometidos e recomendou-lhe o segredo por sua vez. Judar levou muitas provisões para casa, onde encontrou os irmãos famintos. No dia seguinte, voltou à mesma praia e foi abordado por outro mouro igual ao primeiro; e tudo se passou exactamente como no dia anterior. No terceiro dia, outro mouro apareceu, e Judar amarrou-o e jogou-o às águas da mesma forma. Mas, desta vez, foram as mãos e a cabeça do mouro que emergiram. Judar lançou sua rede e salvou o homem. Quando ele chegou á costa, Judar reparou que ele segurava um peixe vermelho em cada mão. "Por Alá," disse a Judar, "salvaste-me a vida." Retrucou Judar: "Por recompensa, conta-me a história de teus dois irmãos afogados, destes dois peixes e do judeu Chamaia."
- Como adivinhaste, os dois mouros que se afogaram eram meus irmãos, chamados Abdel-Salam e Abdel-Ahad. Meu nome é Abdel-Samad. O que tomaste por judeu é também meu irmão, um verdadeiro muçulmano. Nosso pai, Abdel-Uadud, era um mágico poderoso. Ensinou-nos a magia, a feitiçaria, a arte de descobrir e levantar os tesouros mais bem escondidos. Tornou-nos capazes de mandar nos Jins, nos Marids e nos Afarit. "Todavia, para levar-nos a competir entre nós e nos aprimorar na luta com o mundo, deixou escondido o maior de todos os tesouros, o Chamardal, que contém três objectos milagrosos: primeiro, um anel tão extraordinário que seu possuidor torna-se dono do mundo, capaz de derrotar reis e sultões; segundo, um globo que permite a seu possuidor visitar todas as regiões da terra sem sair de casa, pois, ao virar o globo, cada região visada se desliga e vem até o dono do globo; terceiro, um unguento que, passado nas pálpebras, permite ver os tesouros escondidos em qualquer montanha ou planície. “Ganhará os três objectos milagrosos de Chamardal aquele de nós que apanhar estes dois peixes vermelhos e conseguir a coopera-ção de Judar, filho de Omar, que só pode ser encontrado nas margens do lago Karun. Meus dois irmãos morreram na tentativa de apanhar estes dois peixes. Eu os consegui e te encon-trei. Queres vir comigo ao Marrocos, perto das cidades de Fez e Meknes, e ajudar-me a localizar e levar o tesouro? Dar-te-ei tudo que me pedires e serás meu irmão para sempre. E poderás voltar quando quiseres para teu país e tua casa."
- Ó meu senhor, respondeu Judar, tenho minha mãe e dois irmãos a sustentar. Quem os ali-mentará se viajar contigo?
- Toma estes mil dinares e entrega-os a tua mãe, e promete-lhe que estarás de volta dentro de quatro meses. Judar foi entregar os mil dinares à mãe e obter sua bênção. Quando vol-tou, o mouro colocou-o atrás de si nas costas da mula e voaram. No caminho, Judar sentiu fome e disse ao mouro: "Senhor, acho que esqueceste de trazer provisões para a viagem."
- Não preciso trazer provisões. Tenho este saco encantado. Dele posso tirar todos os pratos que desejar. Estás com fome?
Judar reconheceu que estava. Num instante, o mouro tirou do saco peixes, aves, carnes, frutas, doces, todos preparados com requinte e servidos em pratos de ouro.
- Come, meu amigo, disse o mouro.
- Meu senhor, com certeza colocaste no saco antes da viagem vários cozinheiros e muitos mantimentos.
- O saco é encantado, só isso! respondeu o mouro com um sorriso. É servido por um Afrit que nos traria num piscar de olhos até mil pratos árabes, mil pratos egípcios, mil pratos indianos, mil pratos chineses.
No decorrer da viagem, o mouro perguntou a Judar: "Sabes a que distância já estamos do Cairo?"
- Por Alá. não!
- Nestas duas horas, disse o mouro, já percorremos um mês de viagem. Pois esta mula é uma jiniêh e viaja um ano num dia.
Quando chegaram a Fez, foram à casa do mouro. Descarregaram a mula. O mouro pronun-ciou umas palavras mágicas, e ela sumiu no ventre da terra. Semanas depois, disse Abdel-Samad: "Chegou o dia em que vamos recuperar o tesouro de Chamardal. Para tanto devemos superar diversas provas, cada uma mais difícil que a outra.
- Sentes-te preparado?
- Sim, respondeu Judar.
Foram então ao lugar indicado no meio do deserto onde, sob o efeito de palavras mágicas, portas misteriosas se abriram, dando acesso a galerias, jardins, casas, palácios. Numa das casas, encontraram a mãe de Judar. Era a primeira prova. Judar, seguindo as instruções de Abdel-Samad, ordenou à mãe: "Despe-te."
- Meu filho, gritou a mulher, eu sou tua mãe.
- Despe-te, repetiu Judar. Senão, corto-te a cabeça.
Na realidade, não era sua mãe e sim uma mera aparição. Mas se ele tivesse fraquejado e tido pena dela, teria sido imediatamente abatido por génios malvados. Após dias passados assim em meio a aparições mágicas, provas imprevistas e outras manifestações de terror, Abdel-Samad salvou o tesouro de Chamardal. Agradeceu a Judar pela indispensável coope-ração e convidou-o a pedir o que quisesse. Judar pediu o saco encantado. O mouro entre-gou-o sem hesitar e acrescentou: "Devo-te mais que este saco. Leva também este outro saco, cheio de ouro e jóias, para que nunca mais conheças a preocupação em tua vida."Judar agradeceu e, montado na mula mágica, voltou para o Cairo e foi directamente à sua casa. E qual foi a sua pena quando viu a mãe vestida de farrapos e sentada na soleira da porta a pedir esmolas. Ela contou-lhe que seus irmãos a haviam maltratado e arrancado dela todo o dinheiro que lhe dera. Vendo a casa vazia, Judar encheu-a imediatamente de mantimentos, graças ao saco encantado. Quando Salim e Salim souberam da volta do irmão e de suas riquezas, procuraram-no mais uma vez, e ele recebeu-os mais uma vez festiva-mente. E viveram juntos, comendo o que lhes apetecesse. Mas a natureza incuravelmente malvada daqueles dois irmãos prevaleceu de novo. Observando e aproveitando a indiscrição da mãe, souberam do saco encantado e roubaram-no. Depois, tramaram com o capitão de um navio, e este enviou seus marinheiros para raptar Judar e jogá-lo no porão, acorrentado. Mas Deus teve pena dele. Um mercador de Jedá passou por acaso no porão, viu Judar, gos-tou dele e tomou-o a seu serviço numa peregrinação a Meca. Lá, outro acaso feliz o pôs no caminho de Abdel-Samad, que estava cumprindo o dever da peregrinação. Reconheceu-o e mostrou-lhe a bondade de um pai. Presenteou-o com quinhentos dinares e ofereceu-lhe o anel mágico que fazia parte do tesouro de Chamardal. Judar voltou para casa mais uma vez rico e honrado, e acolheu novamente seus irmãos e perdoou-lhes todas as ignomínias. E, aproveitando o anel mágico, mandou o Afrit edificar um palácio mais sumptuoso que o palácio real. Com o tempo, o rei, Chams Ad-Daula, ouviu falar de Judar e do esplendor de seu palácio. Um dia, foi visitá-lo. Por sua vez, Judar ouviu falar da filha do rei, uma adoles-cente mais bela que a plena lra, e pediu-a em casamento. O rei concordou. Os dois jovens foram unidos pelos laços do matrimônio e por uma ardente paixão recíproca, que aumentou ainda mais a amizade entre Judar e Chams Ad-Daula. Judar foi nomeado vizir. E quando o rei morreu, foi ele mesmo proclamado rei, sendo sempre tolerante e generoso para com seus irmãos. Mas estes nunca conseguiram superar sua inveja e sua perversidade. Um deles, aproveitando a oportunidade de um banquete real do qual participava, colocou veneno no prato do rei seu irmão e o matou. O povo chorou o rei bondoso Judar, e os sábios disseram que ele foi vítima tanto de seus irmãos malvados quanto de sua própria generosidade, excessiva e indiscriminada. Pois o provérbio diz: "Faça o bem, mas saiba a quem." Num sen-tido aproximado, Kisra, o grande rei da Pérsia, escrevera ao filho: "Meu filho, cuidado com a compaixão: ela enfraquece o governo; e cuidado com a falta de compaixão: ela provoca a rebelião."


(tradução brasileira)

26/02/2011

Toth e a Invenção da Escrita



Toth é, reconhecidamente, o mais sábio e hábil dentre os deuses, sendo o pai de todas as artes em que o homem se exercita com o raciocínio. Deu-se que, um dia, ao formular as regras do jogo de Senet, esse poderoso deus perguntou-se como poderia preservar o conhecimento em algo mais durável do que a memória.
Por muito tempo essa questão incomodou o deus-íbis, que se ocupava de outras coisas menores enquanto sua inimaginável mente procurava uma resolução para aquele enigma. Depois de um tempo, porém, ocorreu a Toth que poderia usar um caniço afiado e tinta para, em uma folha de papiro, planta que crescia, abundante, no delta, desenhar signos que representassem coisas – como pão, macaco ou barca – e conceitos – como amor, ódio, fidelidade. Durante vários dias, hora na forma de homem com cabeça de íbis, hora na forma de babuíno Toth se ocupa de traçar todos os signos que sua mente imagina. Feita sua obra foi mostrá-la ao rei dos deuses, Rá, e obter sua aprovação para que os homens dela pudesse desfrutar.
No palácio do soberano dos deuses Toth diz:
- Creio ser essa minha mais útil invenção, que permite registrar tudo que se queira em algo mais durável que a memória, especialmente a dos homens, que depressa se embota e se perde. Assim, a grande glória dos deuses estará imperecível, mesmo daqui a milhares de anos.
- O que tua sapiente invenção fará, Thot, é destruir a memória, esse dom que somente os seres humanos tem dentre todos os animais. Afinal, se tudo está registrado, qual será a necessidade de recordar?
- Toda a necessidade, pois os homens poderão confiar na memória, ainda. Recorrerão aos registros daquilo que é muito importante, e será a partir deles que construirão algo novo. Não irão perder mais tempo aprendendo ou ouvindo aquilo que seus pais já sabiam, sem poder se beneficiar da experiência deles. Será, apenas, interpor um veículo certo entre a memória e o ser humano. Eles serão muito ajudados por isso, é o que vejo.
Toth parou, como que refletindo, e disse:
- Imagine qual será a angústia do homem sábio, sem poder ter certeza que suas palavras serão ouvidas pelos seus filhos exatamente como ele desejou que o fossem, posto que precisa confiar na memória dos que irão contar a sua história aos mais novos. Eis ai uma das grandes utilidades da escrita, o pensamento puro e incólume para a mente de seu estudioso. Além disso, imagine como será útil registrar as contas no papel, tendo certeza de que estão corretas, ou o calendário, mostrando que tal ato glorioso de Rá remete a um passado em tantos anos, não em outros quantos. E a cheia do rio Nilo, que vivifica o Egito poderá ser calculada e colocada a serviço dos homens e deuses...
- Fazei então, Toth, como julgas correto, pois que tua invenção sapientíssima, assim como todas as outras anteriores – o calendário, a álgebra, a escrita – estarão a disposição dos homens e deuses.


Contos e Lendas da Mitologia Egípcia

Radharani



Radha foi amiga de infância e cônjuge de alma de Krishna e os dois foram inseparáveis como namorados e mais tarde, como amantes.Esse foi um amor escondido da sociedade, e deu a Radha o status de uma mulher casada. Eles tiveram seus momentos de amor, paixão e ódio - como qualquer casal de amantes. Krishna teve que deixar Vrindavan com Radha, para assegurar que os ideais de verdade e justiça fossem estabelecidos, mas no processo tiveram que deixar o ideal do amor pessoal.
Ele tornou-se um rei, destruiu inúmeros inimigos e casou mesmo várias vezes. E ainda assim Radha permaneceu esperando por ele até ele voltar para ela. Seu amor por Krishna é considerado tão divino e puro que Radha por si só obteve o status de divindade, com seu nome sendo inseparavelmente ligado ao de Krishna.
A maior parte das imagens de Krishna são consideradas completas quando Radha aparece ao seu lado.

A palavra Radha significa "a maior adoradora de Krishna". Nenhuma outra gopi em Vrindavana tem nome tão significativo quanto Radha. É claro, todas as gopis de Braja amam e dão prazer a Krishna.
De qualquer forma, comparada com o oceano de amor de Radha por Krishna, as outras gopis são meros rios, piscinas e baldes. Assim como o oceano é a fonte original de toda a água encontrada nos lagos e rios, similarmente o amor encontrado nas gopis, e todos os outros devotos têm em sua origem Radha sozinha. Desde que o amor de Radha é o maior, ela dá o maior prazer para Krishna. Em Vrindavana, as pessoas são acostumadas a cantar o nome de Radha mais do que o nome de Krishna.

Radha é a alma; Krishna é o Deus. Krishna é o shaktiman - possessor da energia - e Radha é Sua shakti - energia. Ela é a parte feminina da cabeça do Deus. Ela é a personificação da maior amor por Deus, e por sua mercê, a alma está conectada com o serviço e amor a Krishna.

O lobo e o cabritinho



Da casa em que se encontrava, um cabrito viu passar um lobo.
Pôs-se a insultá-lo e a escarnecer-lhe. O lobo disse então:
- O insulto não vem de ti, mas do lugar onde estás.

Moral: Muitos deixariam de ser valentes diante dos fortes se não estivessem em lugar seguro.


Fábulas de Esopo

24/02/2011

Loki e o construtor do muro

Durante muitos anos, os deuses viveram junto com os mortais até que, um dia,Odin, o maior dos deuses, teve a idéia de construir Asgard, a sua morada celestial. Era preciso que os deuses tivessem um local só para si, resguardado dos ataques dos seus terríveis inimigos, os Gigantes. Nem bem, porém, haviam terminado de construir a cidade, depararam-se todos com um grande problema: é que, na pressa, esqueceram de construir também uma sólida muralha para se proteger de um eventual ataque de seus pérfidos inimigos. Odin e Loki estavam conversando sobre o assunto, tendo ao lado outros deuses, como Tyr e Heimdall, quando, de repente, viram passar perto um cavaleiro.
- Uma bela construção a que fizeram...! - disse ele, admirando a arquitetura da divina cidade. - Mas, onde está o muro que deveria protegê-lo?
Os deuses, constrangidos, foram obrigados a confessar que haviam esquecido desta parte.
- Ora, mas isto não é problema! - disse o forasteiro. - Sou o mais hábil construtor do mundo e posso erguer um belo e fortificado muro, se assim desejarem.
Um sorriso de satisfação iluminou a barba ruiva de Odin. Loki, também satisfeito acenou para o homem e lhe disse:
- E quanto tempo levará para terminá-lo?
- Em um ano e meio estará perfeito e acabado.
- Muito bem, pode começá-lo imediatamente! - disse Loki, aplaudindo o construtor.
- Esperem! - bradou Odin, interrompendo tudo. - O senhor disse que é o melhor construtor de todo o mundo, não é?
- Sim, honro-me de sê-lo!
- E, o que pede para realizar a sua tarefa? - quis saber o deus supremo, já imaginando que o hábil construtor não pediria pouco.
- Quero a mão da bela Idun em casamento - disse o outro, confirmando as mais negras previsões do maior dos deuses.
Idun era a deusa da juventude e cuidava do pomar onde brotavam as maçãs a juventude, graças às quais os deuses permaneciam sempre jovens e saudáveis.
- Ora, desapareça daqui! - disse Tyr, o mais valente dos deuses, brandindo o seu único punho para o atrevido.
Heimdall, o guardião da ponte Bifrost, que conduzia a Asgard, como não podia falar,protestou tocando sua cometa tão alto no ouvido do estrangeiro, que construtor sofreu um sobressalto e precisou de alguns minutos para recuperar inteiramente a audição. Quanto aos demais deuses, já iam todos dando as costas, incluindo Odin, quando ouviram Loki dizer ao atrevido forasteiro:
- Muito bem, se puder construir em seis meses, o negócio está fechado! Todos os rostos voltaram-se, alarmados, para o imprevidente deus.
- Imporemos apenas a condição de que realize sozinho a sua tarefa e no espaço de um único inverno - disse ainda Loki, sem se importar com as censuras que faiscavam no olhar de seus colegas. Para estes, entretanto, disse à boca pequena:
- Não se preocupem: em seis meses, ele não terá construído nem a metade do muro, o que o obrigará a nos entregá-lo de graça!
- Trato feito! - disse o construtor, que pareceu muito satisfeito com a proposta. No mesmo instante, desceu de seu cavalo Svadilfair e meteu mãos à obra. Acoplando um trenó à cauda do cavalo, ele começou a empilhar e a arrastar enormes pedregulhos pela neve com tanta vontade e determinação, que todos os deuses empalideceram, menos Loki, que olhava para o homem com um sorriso irônico.
- Não se aflija, bela Idun! - disse ele à infeliz deusa, que vertia pelos olhos pequeninas lágrimas douradas. - São fanfarronices do primeiro dia; amanhã, ele á estará exausto e jamais conseguirá terminar o muro dentro do prazo estipulado!
Mas, no segundo dia, o ritmo não diminuiu; na verdade, aumentou e, ao fim do primeiro mês, o estrangeiro já havia construído um bom pedaço, grande o bastante para deixar em pé os cabelos de Odin.
- Loki, seu idiota...! - disse ele, chamando o responsável pelo iminente desastre. - Se a coisa for neste passo, antes mesmo dos seis meses, ele terá concluído o maldito muro e perderemos Idun e as maçãs da juventude! Não lhe passou pela cabeça, cretino, que este construtor pode ser um gigante disfarçado a tramar a nossa destruição? - indagou Odin a Loki, que cocava a cabeça, com um ar culpado.
Idun, por sua vez, observava noite e dia, com desolação, a movimentação do construtor e cada pedra que ele depositava a mais sobre o muro, era um golpe cavo que soava em seu peito. Seus olhos estavam sempre postos sobre as costas suadas do infatigável construtor e de seu portentoso cavalo que arrastava no trenó, sem um minuto de descanso, os grandes pedregulhos.
O tempo passou e faltavam agora somente cinco dias para a chegada do verão e um pequeno trecho para que o muro estivesse concluído.
Odin fez um sinal para que Heimdall fizesse soar a sua trompa, convocando os deuses para uma reunião de emergência.
- E agora, seu tratante? - disse Odin, tão logo avistou Loki adentrar o salão. - Já que foi esperto o bastante para nos meter nesta enrascada, trate de arrumar um jeito de nos tirar dela, caso contrário, você irá para o sombrio Niflheim, onde sofrerá torturas tão cruéis que nem mesmo sua filha Hei o reconhecerá!
- Verei o que posso fazer, poderoso Odin - disse Loki, o qual, se era imprevidente a ponto de se meter a todo instante em enrascadas, não era menos hábil em se safar destas mesmas situações.
Loki internou-se numa grande floresta e, naquela mesma noite, enquanto o construtor trabalhava com a ajuda de seu cavalo, ele retornou de lá transformado numa belíssima égua branca. Postando-se diante do cavalo do construtor, a égua começou a relinchar melodiosamente (tanto quanto um eqüino possa ter alguma melodia), o que fez com que Svadilfair arrebentasse, afinal, os freios que o mantinham preso ao trenó e
seguisse a égua floresta adentro.
- Ei, espere, aonde vai? - gritou o construtor, espantado.
O cavalo, entretanto, lançara-se numa corrida tão desenfreada que, por mais que seu dono tentasse alcançá-lo, não pôde fazê-lo. Depois de descansar um pouco e refletir,porém, o construtor farejou naquilo o dedo de Loki.
- É claro! - exclamou furioso. - Tão certo quanto sou um gigante disfarçado de construtor, esta égua não passa do maldito Loki disfarçado!
O gigante, então, vendo que não conseguiria terminar o muro sem o auxílio de seu prodigioso cavalo, resolveu reassumir a sua forma natural para tentar completar a tarefa.
Odin, contudo, que a tudo assistia de seu trono, exclamou tomado pela ira:
- Tal como eu imaginava: o tal construtor não passa, na verdade, de um maldito gigante!... Ótimo, pois com isto fico também desobrigado de meu juramento! - Odin suspendeu no ar a mão que alimentava seus dois lobos, Geri e Freki, e ordenou,imediatamente, que um servidor fosse chamar seu filho Thor.
- Thor, preciso que, mais uma vez, faça uso de seu martelo Miollnir para derrotar este gigante impostor! - disse Odin, depositando todas as esperanças em seu valente filho.
Thor não esperou segunda ordem: empunhando seu martelo e afivelando bem à cintura o seu cinto de força, foi até o gigante, que empilhava, freneticamente, imensos pedregulhos no afã de terminar logo a sua tarefa. O rio de suor, que lhe escorria dos membros, fizera com que a neve ao seu redor tivesse derretido toda.
- Ora, vejam...! - disse Thor, ao se aproximar dele. - O pequeno construtor virou, então, de uma hora para a outra, um gigante atarefado?
- Fique longe de mim! - disse o outro, carregando em desespero a última pedra que faltava para completar o muro.
Porém, antes que tivesse tempo de colocá-la sobre o último vão do muro, Thor arremessou seu martelo com tal força e velocidade, que a cabeça do gigante se esmigalhou inteira.
- Aí está, patife, o seu pagamento! - disse o deus, recolhendo Miollnir. O gigante teve, logo em seguida, o restante de seu corpo jogado nos gelos eternos de Niflheim.
- E então, tudo correu bem? - disse Odin ao filho, tendo ao lado Idun.
- Já deve estar construindo seus muros na terrível morada de Hei! - disse Thor,enquanto retirava sua pesada luva de ferro.
Todos os deuses regozijaram-se com uma grande festa, aliviados que estavam pela derrota do gigante. Entretanto, em meio a ela, alguém perguntou:
- E Loki? Que fim levou o espertalhão?
De fato, Loki havia desaparecido de Asgard desde o instante em que entrara na floresta com o garanhão do gigante. Durante muito tempo, ninguém ouviu falar dele até que, um belo dia, ressurgiu, trazendo um belíssimo e prodigioso cavalo negro de oito patas.
- Ora, viva! Finalmente, reapareceu! - exclamou Odin, que, no entanto, parecia mais interessado no cavalo do que no deus desaparecido.
- Apresento a vocês Sleipnir, o cavalo mais veloz do universo! - disse Loki, todo sorridente.
Loki, por mais incrível que possa parecer, tornara-se pai de um cavalo; mas, para quem já havia sido anteriormente pai de um lobo e de uma serpente, não havia nisto nada de surpreendente. Entretanto, percebendo que Odin apaixonara-se, perdidamente, pelo cavalo, tratou logo de lhe dar o animal de presente na esperança de fazer com que esquecesse, rapidamente, de suas trapalhadas.
E foi assim que Odin se tornou dono do cavalo mais veloz do universo.


O lobo e o cão



Não tinha um lobo mais que a pele e o osso.
Sinal é que, de orelha arrebatida,
Bem vigilante andava a canzoada
Encontra o lobo um dogue forte, grosso,
Nutrido, luzidio, uma beleza!
Que distraído abandonara a estrada .
Sorri-lhe a nédia presa.

Saltar-lhe logo ali, fazê-la em postas
O seu desejo fora. Dura empresa!
A luta era infalível! Voltar costas
Não usam perros quando são valentes,
E, mais os brutos! dão às vezes cabo
Do fero contendor! Diabo! diabo!
Então aquele, com aqueles dentes!
Humilde o lobo, Pois, encolhe a cauda;
Chega-se ao cão, abaixa-lhe a cabeça;
Puxa conversa; diz que folga em vê-lo,
Que deixe que ele admire, que ele aplauda.
Topá-lo assim... e com tão bom cabelo!...
E rijo! e gordo! Um frade! uma abadessa!

«Esplêndido senhor – o cão responde -
De vós depende o ter igual gordura.
Fugi dos bosques, onde
Por teima da desgraça,
De fome e frio só achais fartura,
Vós, senhor lobo, e a vossa pífia raça.
Dias e dias sem comerem nada!
E lá por festas raras, esquecidas,
Um petisquinho conquistado à espada,
Tragado às escondidas!
Aí é certa a morte!
Furtai-vos a seus braços!
Segui... segui meus passos;
Tereis outro destino e melhor sorte.
Mas como? – volve o lobo.
Fazer então que devo? – Bagatela:
Nem morte de homem, nem de igreja roubo;
Simplesmente estas coisas: não dar trégua
À santa gente rota, mendicante,
Bordão numa das mãos, noutra a tigela,
Que vem inda a distância duma légua
E já tresanda a essência de tratante.
Lamber as mãos ao dono; ser submisso...

Dar coca – é o termo próprio – ao dono e a todo
Quanto bicho-careta houver em casa.
Salário apanhareis que vos apraza:
Ossos das aves, rodas de chouriço,
Restos vindos da mesa, e tudo a rodo!
Até uns tagatés em cima disso!»

Tendo prestado ao cão atento ouvido,
O lobo, coitadinho!,
Com perspectiva tal enternecido,
Não tugiu nem mugiu, mas fez beicinho!
Iam caminho já do povoado,
Quando o lobo notou que no pescoço
O cão era pelado!
Que tens aí? – pergunta em alvoroço.
– Nada, que eu saiba. – Nada?! – Frioleira
– Mas afinal o que é? – Ora!... a coleira,
Com que à noite me prendem junto à porta...
– Prender-te?! – o lobo exclama. Não sais fora,
Não corres livre pela terra inteira
Quando te dá na gana, e a toda a hora?
– Nem sempre. Isso que importa?
– Tanto importa, que toda a trincadeira
Com que me acenas, um tesouro embora,
Por tal preço não quero!»
O lobo finda,
Põe-se logo na perna, e corre ainda!


Tradução de Francisco Palha