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07/04/2011

O Jovem Mestre de Confúcio



Confúcio estava muito cansado de ler e decidiu descansar um pouco. Mas o que fazer? Mesmo quando descansava, ele queria fazer alguma coisa. Resolveu então sair num carro de búfalo para ir até o Monte Jing. Enquanto os búfalos negros avançavam pela estrada, ele admirava a primavera que tinha chegado. E pouco depois, ele avistou a montanha, com um colar de neblina. Confúcio ficou muito contente. Ele tinha certeza de que do alto poderia avistar todo a planície, até se perder de vista, com a crista das colinas perfiladas mais adiante, uma depois da outra, até o horizonte.

Estava tão distraído que nem percebeu um menino fazendo barro com um balde de água, para erguer uma muralha de brinquedo no meio da estrada. Confúcio achou muito estranho, pois não tinha passado por nenhuma casa por perto. Mas não se importou. A casa onde o menino morava podia estar entre as árvores. Ele ergueu o braço e deu um grito para que os búfalos avançassem, achando que o som de sua voz serviria também para alertar o menino, pois, afinal de contas, o meio da estrada não é o melhor lugar para se brincar.
O menino que construía a miniatura da muralha virou a cabeça, avistou os búfalos puxando a carroça e depois o condutor. Em seguida, pegou mais um pouco de barro e completou a edificação, sentando-se atrás dela, como se assim estivesse protegido. Confúcio ficou bravo:
- Ei, não vê que estou passando? Sai do caminho, quero chegar logo ao Monte Jing
O menino caiu na risada:
- É o carro de búfalo que tem de contornar a muralha. Onde já se viu uma muralha sair do lugar para dar passagem a um carro de búfalo, de boi ou outro qualquer!
Ouvindo isso, Confúcio teve duas reações. A primeira, de raiva. Que falta de respeito com os mais velhos! E também de admiração: o menino tinha dado uma boa resposta. Então contornou a muralha - para isso teve de entrar no mato - e parou ao lado do menino. Perguntou quantos anos ele tinha:
-Sete – foi a resposta.
- Só sete? Apesar de sete, me deu há pouco uma boa resposta. Qual é o seu nome?
- Não tenho nome nenhum.
Confúcio olhou bem para o menino e pensou, ele é inteligente, mas agora vai se ver comigo. Pensou isso porque Confúcio gostava também de brincar, só que com palavras e idéias. E queria saber até onde uma criança de sete anos conseguiria acompanhá-lo nesse jogo.
- Sem Nome, me diz uma coisa: conhece montanha sem pedra? Pé sem dedo? Céu sem passarinho? Água sem peixe? Porta que não fecha? Égua sem potrinho? E fogo sem fumaça, conhece? Conhece homem sem mulher? Mulher sem marido? Macho sem fêmea? Árvore sem galho? Cidade sem governo? Gente sem nome?
Ele disse, bem devagar, como se mastigasse as palavras. O menino ergueu a cabeça e respondeu, bem devagar, como se cuspisse a resposta:
- Uma montanha de terra não tem pedras. Pé-de-mesa não tem dedo. No céu da boca pássaro não voa. A água do poço é sem peixe. Porta sem batente não fecha e um cavalo de madeira não dá cria. Além disso, fogo-fátuo não solta fumaça. Imortal não tem mulher. Fada não tem marido. Solteiro vive sem mulher. Árvore seca não dá galhos. Uma cidade abandonada não tem prefeito. E menino, como eu, não tem nome.
Confúcio engoliu em seco. O menino tinha resposta para tudo:
- Você tem resposta para tudo. Vamos sair juntos pelo mundo, para que ele seja em tudo igual?
- O mundo não pode ser igualado. No alto, erguem-se as montanhas, embaixo, correm os rios e estende-se o mar. De um lado, uns governam, mas do outro, estão os governados. Por isso o mundo não pode ser igualado. Poderia ser mais igual, isso, sim!
- Se nós dois aplanássemos as montanhas, teria terra e rocha para encher o mar e os rios. Nós poderíamos também expulsar os que têm tudo e libertar os escravos. Nesse caso, o mundo seria igualizado.
- Se aplanássemos as montanhas, onde os animais se refugiariam? Se enchêssemos o mar e os rios, onde nadariam os peixes? E se expulsássemos os que têm tudo, quem iria lhe dar emprego? E se todos os escravos fossem libertados, por que continuariam a lhe pedir conselhos?
- Certo, certo – exclamou Confúcio – você consegue responder as questões mais complicadas, mas duvido de que seja capaz de responder as mais simples. O que é esquerda e direita?
- O Leste e o Oeste – respondeu o menino*.
- O que é interior e o que é exterior?
- O Sul e o Norte – respondeu ele.
- Quem é o pai, a mãe, o marido e a esposa?
- O céu é o pai, a terra, a mãe, sol é o marido, a lua, esposa – disse o menino.
- De onde vêm as nuvens e a neblina?
Ele tinha a resposta na ponta da língua:
- As nuvens são vapores de água que subem da terra e que voltam para a terra na gota de chuva, e a neblina sobe da terra, mas tem preguiça de chover.
- Quando o galo vira faisão? – perguntou Confúcio.
- Quando ele chega perto do brejo e da montanha.
- E quando o cão vira raposa?
- Quando ele chega perto das colinas e montes.
- Bom! – disse Confúcio - você não perde uma! Mas será que um menino de sete anos pode adivinhar isso aqui: a mulher está mais perto de seu marido que uma mãe de seu filho?
O menino riu novamente, como se achasse a pergunta muito fácil:
- A mãe está mais perto de seu filho que uma mulher, de seu marido.
- Ah, essa, não! – disse Confúcio – É o contrário. A mulher está mais perto de seu marido do que uma mãe de seu filho. E quer saber por quê? Porque durante sua vida a mulher e seu marido dormem juntos, na mesma cama, e cada um tem um travesseiro ao lado do outro. E quando morrem, estão lado a lado, nos seus túmulos.
- Quem perdeu foi o senhor - disse o menino – porque o que eu disse é certo, pois é o contrário do contrário: a mãe está mais perto de seu filho que uma mulher, de seu marido. E provo o que estou dizendo: a mãe é para o filho o que as raízes são para as árvores. Uma mulher é para o seu marido o que as rodas são para o carro. Quando a mãe morre, o filho é órfão para sempre. Que nem a árvore ao morrer: secam seus galhos e suas folhas. Mas se uma mulher morre, seu marido pode se casar com outra mulher e recuperar a alegria. Do mesmo jeito, um carro, quando perde as rodas, pode conseguir outras novas. Ou então, todo o carro pode ser novo. O senhor me desculpe, mas só um louco diria que uma mulher está mais perto de seu marido do que de seu filho.
Dessa vez, Confúcio pareceu confuso. O menino aproveitou a oportunidade e interrogou o mestre:
- Respondi todas as suas perguntas, agora, peço que responda as minhas. Como os gansos e os patos conseguem nadar? Como os grous e os gansos selvagens conseguem gritar? Como os pinheiros e os ciprestes conseguem ficar sempre verdes, tanto no verão como no inverno?
Confúcio respirou fundo. As perguntas eram fáceis. Superfáceis.
- Porque eles têm as patas espalmadas.
O menino balançou a cabeça:
- Não é uma boa razão. Primeiro, pata não pode ser espalmada, porque palma existe é na mão. E as tartarugas também nadam, e não têm as patas "espalmadas".
Pego de surpresa, Confúcio disse:
- Pois é... - mas se recuperou logo, passando para a pergunta seguinte: - Como têm um pescoço comprido, os grous e os gansos selvagens podem gritar.
O menino sacudiu a cabeça:
- Também não é uma boa resposta. As rãs também gritam e elas não têm pescoço comprido.
De novo Confúcio ficou mudo. E depois conseguiu dizer:
- Pois é... - e passou para a última pergunta – como têm um cerne duro, os pinheiros e os ciprestes ficam sempre verdes, tanto no verão como no inverno.
Mais uma vez o menino sacudiu a cabeça:
- O senhor nunca dá a boa razão ou a boa resposta: o bambu também fica sempre verde, no inverno e no verão, e ele nem cerne tem, pois é oco por dentro.
Confúcio, cada vez mais confuso, calou-se, enquanto o menino fazia as últimas perguntas que tinha para fazer:
- Quantas estrelas tem no céu?
Confúcio pareceu fugir da pergunta:
- Estamos falando da terra e não do céu.
- Certo, não vamos falar do céu. Quantas casas existem sobre a terra?
Confúcio ficou nervoso:
- Melhor não falar nem do céu nem da terra. Vamos falar das coisas que estão diante dos olhos.
O menino riu novamente:
- Ah, certo – disse – vamos falar das coisas que estão diante de nossos olhos: quantos pelos o senhor tem nas sobrancelhas?
Confúcio pareceu cansado e suspirou:
- Desisto, eu não consigo ganhar, nem fazendo perguntas, nem respondendo as que me faz. Acho agora que temos de temer uma criança. Você quer seu meu mestre?
O menino continuou a brincar em silêncio na estrada e não respondeu.